Capítulo I – Cinema – Arte

The Masquerade Folia: a reflection about culture and image in the visual metaphors present in the animation The Boy and the World

A folia dos Mascarados: uma reflexão sobre cultura e imagem nas metáforas visuais presentes na animação O Menino e o Mundo

Patricia Perez de Moraes Nepomuceno

Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil

Mauricio Silva Gino

Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil

Abstract

The article is an analysis of the conflict between culture (represented in the animation as cheerful revelers) and the armed forces pictured in the brazilian animation The Boy and the World (2013), produced by Alê Abreu. In this context, we will highlight some frames of the narrative containing the symbols and metaphors that represent these conflicts and analyze them in the light of the theories of Lakoff and Johnson, Mikhail Bakhtin, Nestor Canclini among others, who discuss popular culture, image and visual metaphors.
The conflict in the film raises several questions, the main one being the relationship between the Boy and the culture present in the film as our own cultural erasure. Symbolically, the death of culture in the film may be the denial of our identity and the permanence of the choice of what is or is not culture in the hands of the dominant powers of this “World”.
Metaphors are not able to provide a full, consistent and comprehensive understanding of all aspects of your target concept when considered in isolation (Lakoff and Johnson 2008, 92) but we can make important contributions to this medium through their interpretations. In this context, this article seeks to bring reflections about the death and rebirth of a culture represented in the film. However, this analysis is not committed to bringing absolute answers, as they depend on the relationships between the author’s intention, the spectator’s previous baggage and the cultural and social context in which the animation is inserted.

Keywords: Art, Cinema, Animation, Metaphor, Culture

1. Introdução

O filme O Menino e o Mundo (2013), de Alê Abreu, é uma referência no campo da animação brasileira, destacando-se merecidamente pelos prêmios importantes conquistados, como o Prêmio Cristal de longa-metragem no encerramento do 38º Festival do Filme de Animação de Annecy em 2014, no leste da França e a indicação para concorrer ao Oscar na categoria melhor filme de animação em 2016, após um movimento crowdfunding1 para que o filme fosse exibido em solo estadunidense. E a partir deste momento, consolidou-se um extraordinário desempenho do filme junto ao público e críticos em seu campo de estudo.

Originalmente, a ideia para a animação surgiu a partir de um documentário com animações inseridas chamado Canto Latino. O autor comenta, no making off de sua página do YouTube Filmes de Papel, que o Menino surgiu de outro trabalho que estava criando e a partir da personagem, uma nova história foi tomando forma. O personagem saiu das páginas do seu diário gráfico ou sketchbook, e revelou-se numa incrível jornada de descobertas e emoções. O filme foi gerado sem praticamente um roteiro escrito, sendo montado a partir deste exercício criativo do autor em seu caderno de esboços.

Observamos na animação uma narrativa pautada em poderes diacrônicos. Onde os opostos apresentados na ambientação do interior, floresta lúdica em contraponto a cidade cinzenta caótica e assustadora, porém também fascinante, ambientam a jornada do Menino que ao ser abandonado por seu pai, parte para uma aventura de descobertas que lhe vão sendo reveladas lentamente. Como o autor define muito bem, o mundo invade o jardim, (Abreu 2013).

Marcado por estas rupturas e outras múltiplas facetas, a narrativa vai desenrolando, através do olhar de um menino, a animação não possui falas, fortalecendo os elementos musicais que se entrelaçam na diegese. No processo criativo, a escolha da linguagem plástica reverbera em seus elementos narrativos. Por optar em usar o mínimo de elementos digitais, o autor construiu a história do Menino a partir de materiais tradicionais do desenho e da ilustração, os quais a materialidade salta aos nossos olhos através das aquarelas, guache, giz de cera, canetinhas coloridas, colagem e lápis de cor que nos trazem textura, pintura e a tensão nos desenhos trazendo muitos acasos a narrativa.

O Menino e o Mundo nos presenteia com singularidades do mundo metafórico tornando-se um ambiente rico em simbologias que podem ser apuradas pelo público dependendo de sua bagagem prévia, no entanto, alguns elementos se fazem universais e podemos questioná-los e entendê-los a partir de alguns diálogos com autores do ramo de pesquisa das metáforas (Lakoff e Johnson 2008).

A animação como um todo é marcada por dualidades que perpassam na jornada do Menino, e selecionamos aqui para esta reflexão, o momento que é marcado por conflitos, onde aparecem metáforas relacionadas à cultura, representando festejos populares e outra que representam os conflitos e o poder hegemônico deste mundo, sem deixar de destacar que tudo acontece através do olhar do Menino, é a sua visão que nos é mostrada, assim como as suas reações e como ele enxerga este universo. Os símbolos e as metáforas visuais atuam representando sentimentos, afetos, descobertas e transformações.

No entanto, esta análise não se compromete a trazer respostas absolutas a respeito das reais intenções do autor, pois este resultado depende das relações entre o objetivo do mesmo, a bagagem anterior do espectador e o contexto cultural e social em que a animação está inserida. Contudo, não nos impede de trazer estas interpretações que discutiremos a respeito a luz das teorias vigentes.

2. Processo criativo, o diário gráfico

Para quem é ilustrador ou artista plástico, há uma rotina bem comum que todos conhecem: a de carregar caderninhos de esboços, desenhos e estudos por todo lado para quando a imaginação e criatividade surgir – ou se até mesmo se faltar inspiração – colocamos alguns apontamentos para a ela voltar, usamos o famoso Sketchbook. E para além dos treinos sobre a forma, pintura e exercícios de criatividade, os cadernos podem trazer um trabalho e/ou projeto pronto para sua finalização, como aconteceu no processo criativo em O Menino e Mundo.

A animação foi feita a partir de um diário de imagens (figuras 1 e 2), sem praticamente um roteiro escrito, conforme Alê Abreu explica no seu canal do Youtube. Ao longo da produção, o autor comenta que criou dois diários com anotações e imagens que foram guias para a narrativa, apontamentos para desenhos, rascunhos e algumas anotações. Ele comenta: “são trechos que eu nem sabia que iam entrar” (Abreu 2013). Percebemos que mesmo na animação, onde podemos ter um maior controle das ações da história, situações inesperadas podem surgir, como se o trabalho também falasse para o seu criador. Neste processo foi surgindo uma obra, e o filme foi sendo construído desta forma, sem uma ordem certa.

Pensando de forma convencional no processo de criação para o cinema, o roteiro é um elemento textual e um documento que servirá como um guia para cenas e diálogos de produtos audiovisuais. No entanto, Rafael Conde, Professor da UFMG e Diretor de Cinema, em artigo publicado em 2014 pela Revista Em Tese do em Estudos Literários da UFMG, nos atenta para uma discussão importante sobre o papel do roteiro no cinema que “algumas vezes é negado como origem da verdadeira autoria do filme e outras questionado como elemento de controle sobre a vocação documentária do filme”.

Neste sentido o diário de viagem é uma peça documental e singular no processo criativo do filme, levando o status de roteiro, mesmo que não convencional, Conde também destaca:

A presença do desenho de uma encenação em todas as etapas da construção do filme, a habilidade e domínio do processo da passagem do impalpável da imaginação, desenhada no roteiro ou na simples ‘ideia de filme’, para a materialidade concreta das imagens em seu devido suporte, demanda uma técnica, uma série de habilidades sobre o domínio da cena, certa interação entre um espaço, uma ação, um ator e um tempo, além da habilidade para a manipulação das qualidades e possibilidades intermediadoras da câmera. (Conde 2014, 160)

Figura 1 - Diário visual e anotações do Diretor Alê Abreu

Figura 2 - Alê Abreu comenta trechos do seu diário que entraram no filme.

E esta parte fundamental do processo criativo, muitas vezes é colocada às margens da produção, vista talvez como um elemento operacional. Mas é justamente ali que está a espinha dorsal do objeto, onde nasce o inesquecível e também onde se transforma. Não temos a pretensão de propor aqui um manual de roteiro, mas sim como ele se apresentou no processo criativo de O Menino e o Mundo onde ele se mistura a imagens que vão dando corpo a uma história emocionante contada de forma quase artesanal, indo de encontro às hegemonias da animação atual, outro ponto que nos chama atenção para este Menino.

Olhando do ponto de vista criativo, os cadernos de estudos são ferramentas fundamentais no processo de um roteiro de animação, acredita-se ser dispensável a criação de um roteiro formal se analisarmos como foi o desenvolvimento criativo de O Menino e o Mundo, claro, cada autor tem sua forma de conceber um projeto, e no caso da produção brasileira, foi como se combinássemos os dois processos em um: o roteiro e o storyboard. A forma aleatória com que Abreu agiu na montagem do seu roteiro, nos infere que nem sempre o domínio da história está totalmente no controle, há momentos que o trabalho também conversa conosco, mostrando um novo caminho e outras saídas.

Especificamente em O Menino e o Mundo, tal forma de lidar com roteiro nos parece natural quando observamos o próprio tratamento plástico e técnico da animação, ela é em 2D, com um processo de experimentações e técnicas tradicionais como lápis de cor, giz de cera, aquarela, guache, colagem e até um recorte de um documentário inserido em determinado momento. Rica em texturas e materialidades que reforçam todas as tensões vividas pela personagem.

Esta fragmentação do roteiro e das imagens nos remete a discussão acerca da intermedia, o envolvimento de dois meios para um objetivo em comum, no entanto o termo mais aplicado a mídias que se relacionam, como literatura e teatro, quadrinhos e cinema, tomamos emprestado o termo para algo intrínseco ao fazer do cinema para justificar esta simbiose de texto e imagem. Às vezes, nos processos de criação narrativos de uma história, elas aparecem primeiro como imagem e não textualmente no imaginário dos autores.

3. O embate da cultura e do Mundo

A narrativa é construída por elementos que se desafiam e conflitam entre si, mostrando rupturas e transformações ao longo da história. Por um lado, temos o Menino em sua jornada que, quando seu pai parte do campo para tentar outras possibilidades de trabalho, o Menino o segue encontrando um mundo diferente do que ele deixou para trás. Estas dicotomias são manifestadas por metáforas visuais que representam os sentimentos, emoções, alegrias e transformações. Elas surgem desafiando outros momentos de tensão, preocupações e conflitos.

De um modo geral, o recorte do filme que é objeto deste estudo, tem seu ápice em 1h01min da narrativa. Neste momento, podemos observar a chegada de um exército – que possivelmente representam o lado que detém o poder – acompanhado de sons da cidade, ruídos e barulhos. O Menino está olhando o grupo de soldados a sua frente. Há uma banda junto a tanques de guerra (como a visão é de uma criança, estes tanques parecem monstros). Neste momento, surge um pássaro, que representa o grupo de manifestantes, os foliões (a cultura e a música).

Os dois grupos se enfrentam, simbolizados pela música e pelos os pássaros (de uma lado um pássaro colorido e do outro um pássaro negro). Até o momento em que um deles cai, o que representa o grupo dos foliões. As bolinhas coloridas que simbolizam seus sentimentos e emoções escorrem para um bueiro. A seguir alguns frames desta sequência comentada (figura 3).

As bolinhas coloridas existem em toda animação, simbolizam vozes, sons e emoções, nos revelando algo que nos parece um sistema metafórico, pois há similaridades entre cadência de símbolos visuais que representam a linguagem e as emoções dos personagens. (Lakoff and Johnson 2008, 43)

Para o Menino, máquinas que desmatam as florestas, guindastes que levantam contêineres, e outros objetos industriais são como monstros ou animais, atribuindo um tipo de zoomorfismo a estes maquinários, representados por colagens diversas e texturas que expressam estas transformações. O Menino vai testemunhando estes eventos conforme segue em sua jornada.

O primeiro encontro do Menino com o grupo de festejo popular2 foi em um momento diferente do comentado anteriormente, é importante voltar nesta parte porque é quando percebemos alguns códigos visuais e sonoros importantes para a narrativa. Os foliões estão mascarados, eles estão dentro de seus personagens, com vestes e máscaras. Os sons emitidos por seus instrumentos e a alegria do grupo é simbolizada por bolinhas coloridas que voam pelo ar, como comentamos anteriormente (figura 4).

Figura 3 - Alguns frames da sequência da derrota dos manifestantes.

Figura 4 - O festejo popular.

Se tentarmos apontar alguma similaridade com os festejos brasileiros ou latino-americanos, podemos ver bastante semelhanças com uma festa popular especifica, católica e interpretada como parte do folclore brasileiro, a Folia de Reis3. Nesta manifestação, o grupo de foliões sai numa jornada de horas e interagem com os moradores por onde passam estabelecendo os ritos que fazem parte dessa folia, sem no entanto atrapalhar o processo (Paulino 2010). Vemos esta semelhança com a Folia de Reis, quando o Menino interage com o grupo de forma que não abala o seu rito.

A Folia de Reis se encontra em nossas celebrações litúrgicas desde a época da primeira encenação que se tem notícia no Brasil, realizada pelo Jesuíta José de Anchieta em 1561 (Paulino 2010, 2 apud Cf. Silva, 2006). E que também inspirou diversas outras manifestações populares em todo o país.

Voltando na questão simbólica, na Folia de Reis (figura 5) observamos alguns ícones parecidos presentes nos manifestantes presentes em O Menino e o Mundo (figura4), as máscaras e os chapéus em formato de cones estão presentes no grupo de festa do filme. Tratando-se especificamente da máscara, já é da natureza da animação o caráter simbólico e lúdico, principalmente quando quer tratar de temas reais em linguagem intencionalmente metafórica, com o objeto máscara não seria diferente. Os personagem são construídos em linguagem simbólica e ainda estão mascarados, conferindo mais mistério e espaço à imaginação do público/audiência.

Figura 5 - Foliões na Folia de Reis.

A Materialidade é parte do corpo do personagem, Alê Abreu, no making off de O Menino e o Mundo, explica a escolha gráfica do filme, ele buscou usar menos recursos digitais possíveis, a intenção era trazer a força dos materiais utilizados para finalizar os personagens, as texturas, colagens e as tintas diversas. O fundo branco que acompanha os mais de 30 personagens em cena, é proposital para destacar suas texturas e cores, o filme trabalha bastante as questões dos contrastes e dualidades tanto na narrativa quanto no tratamento plástico/visual.

No contexto das festas populares, a máscara aparece para além do objeto puramente artístico, mas age como mediadora entre o espaço da expressão e a manifestação de uma cultura, de uma identidade. E entender estes espaços, traz uma análise mais completa de uma cultura local e de saberes para além das paredes acadêmicas, segundo Marcus Dohmann, pesquisador em Cultura material, percebemos:

A interação do homem com a sua própria materialidade, a qual envolve a sua existência, ressalta a importância dos estudos acerca da cultura material, que, entre dimensões, abordagens e domínios, mostra-se apta a examinar o objeto material, não somente tomado em si mesmo, mas sim em seus usos, nas suas apropriações sociais, a partir das técnicas de produção envolvidas; na sua importância econômica e suas necessidades sociais e culturais. (Dohmann 2017, 42)

Retomando o momento do conflito, à luz das metáforas presentes no objeto, observamos dois grupos opostos que travam uma batalha, representada através da música e de dois pássaros presentes na ação, o grupo dos foliões lutam contra um exército que representa o poder hegemônico daquele mundo, lembramos que tudo é observado pelo Menino, e nós estamos vendo através do seu olhar de criança. Os dois pássaros, que lutam na sequência mostrada na figura 4, são conceitos abstratos (quadro 1) para algo verdadeiro, a violência é tratada de forma simbólica. Há um sufocamento da cultura presente no hipertexto do filme. Abaixo uma lista da metáfora e do significado apreendido:

Metáforas visuais Alguns significados apreendidos
Folia dos Mascarados, manifestantes, músicos. Representam a cultura, a alegria, identidade, manifestações, liberdade, arte popular e campo.
Exército, governo, cidades, indústrias, maquinas, armas. Repressão, proibição, domínio, hegemonia, poderes, tecnologia e cidade.
Pássaro colorido Outra forma de representação dos manifestantes.
Pássaro negro Outra forma de representação do exército e poder.
Música, bolinhas coloridas e instrumentos. Lembranças, afetos, liberdade, vozes, pensamentos e emoções.

Em determinado momento, a batalha parece estar sendo vencida pelo pássaro dos manifestantes, porém, o exército surge muito mais poderoso, com mais armamentos e maior poder de fogo. Podemos inferir que os poderes hegemônicos ali representados são os que decidem a permanência ou não de uma cultura. Semelhante a esta representação, encontramos nos seus pares, a animação de Marcos Magalhães (1981), o curta-metragem Meow! Que, segundo Maurício Gino (2006), em artigo publicado para a revista TXT: Leituras Transdisciplinares de Telas e Textos e revisitado para o livro Animação Brasileira 100 filmes essenciais em 2018, traz em suas metáforas visuais uma crítica a cultura externa imposta à população, por conta da globalização, o gato (personagem principal) representa a população resistente a receber aquela ‘nova cultura’, porém “depois de um longo processo de convencimento por meios diversos o gato/população se mostra passivo e acaba se rendendo aos benefícios próprios de um mundo globalizado, que lhe são oferecidos pela nova ordem dominante”, (Gino 2018, 28).

Da mesma forma, em O Menino e o Mundo, nós presenciamos a derrota do pássaro e a aniquilação da nossa ‘cultura’, massacrada pelos poderes dominantes. Na sequência de imagens da figura 4, o bico do pássaro da cultura é atingido por um míssil, esta mensagem visual determina a derrota daquele grupo. Metaforicamente, percebemos que ao atingir a boca do pássaro nos mostra o ‘calamento’, silenciamento daquele manifesto, e talvez possamos aferir uma alusão à censura imposta em determinados poderes políticos e ideologias.

Em relação aos poderes hegemônicos que definem o que é cultura ou não, Nestor Canclini observa este fenômenos da modernidade, trazendo contribuições substanciais a estes eventos, ele destaca o popular como sendo o excluído: aqueles que não têm patrimônio ou não conseguem que ele seja reconhecido e conservado; os artesãos que não chegam a ser artistas, a individualizar-se, nem a participar do mercado de bens simbólicos “legítimos”; os espectadores dos meios massivos que ficam de fora das universidades e dos museus, “incapazes” de ler e olhar a alta cultura porque desconhecem a história dos saberes e estilos (Canclini 1995, 205). Na verdade, o povo que não conhece sua própria história porque outros que detém o poder escolhem não contá-las. Podemos incluir esta nota também ao embate demonstrado na animação.

Claro que nesta passagem não é excluído do popular seu valor real, este permanece, mas sim as escolhas do que é arte ou não, são colocadas nas mãos de grupos que determinam estes valores, como instituições, classes dominantes e grupos hegemônicos. Estas decisões recaem sobre a definição do que é o popular em contraponto ao tradicional, e principalmente o híbrido e o que permeia no entre.

4 - Considerações finais

A animação é um campo rico de encantamentos e terreno fértil para formação da nossa memória, educação do olhar e construção cognitiva. E as metáforas são mediadoras deste universo construtivo com o seu público-alvo, gerando entendimentos que se completam com a formação e bagagem anterior do receptor.

Em O Menino e o Mundo, observamos estes espaços e respiros que são utilizados como verdadeiras lacunas que nos são generosamente ofertadas para completemos os entendimentos e as sensações, fazendo o papel das metáforas ainda mais importantes para o entendimentos destes sentimentos e apreensões.

As metáforas intencionais, que são necessárias para que o objeto transmita ao seu público a mensagem que o autor deseja transmitir. Independentemente do meio, ou tecnologia elas são necessárias para que essa mediação com elementos da natureza seja feita. Este é o destaque em O Menino e o Mundo, a música canta as emoções, o estado de humor e o reflexo das descobertas do Menino em relação ao mundo que ele está descobrindo, através de alegorias visuais que traduzem para o pensamento abstrato.

Há momentos de alegrias, tristezas, saudades, surpresa, resiliência e amor. Todos estes sentimentos embalados uma construção da narrativa que nos permite pensar e que suscitam significados. E estes momentos são de responsabilidade do emissor. Contudo, o leitor /espectador precisa de uma bagagem prévia para entender a mensagem por completo, as metáforas não são capazes de fornecer um entendimento pleno, consistente e abrangente de todos os aspectos do seu conceito-alvo, quando consideradas isoladamente. No entanto, diversas metáforas podem se auxiliar mutuamente na compreensão dos diversos aspectos desse conceito-alvo, formando assim um sistema conceitual. (Lakoff e Johnson 2008, 43 )

O sistema conceitual que observamos é, quando além de uma única metáfora visual presente em um determinado sentindo da animação, existe uma subdivisão que gera desdobramentos de significados, como as próprias bolinhas coloridas que simbolizam a música, mas também as emoções e neste momento compreendemos que foi estabelecido pelo autor um conjunto de linguagem visual que representam ou mediam outros significados.

Assim, concluímos que além de importantes ferramentas para trabalhar nos produtos audiovisuais, as metáforas visuais possuem um poder transformador cultural e social, e que foi sabiamente demonstrado e utilizado por Alê Abreu em O Menino e o Mundo, trazendo ao público formas de entendimento, compreensão e comunicação com meio em que vivemos e suas múltiplas formas de existir e interagir.

Agradecimentos

Agradecemos à CAPES, ao Programa de Pós-Graduação em Artes, e à Pró-Reitoria de Extensão da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) pelo auxílio concedido para inscrição desta comunicação na Conferência Internacional de Avanca 2021 por meio da verba PROEX.

Notas Finais

1Para que o filme fosse exibido em solo americano, a equipe abriu uma campanha de financiamento coletivo, na plataforma Cartase, para divulgação do filme em parceria com a Gkids, distribuidora do filme nos EUA.

2As múltiplas manifestações culturais podem subdividir-se em três grandes categorias, em relação ao a animação o Menino e o Mundo, a manifestação que percebemos se enquadra na primeira categoria defendida por Bakhtin, as formas dos ritos e espetáculos, festejos carnavalescos, obras cômicas representadas nas praças públicas, etc. (Bakhtin 2008, 4).

3A Folia de Reis, Companhia de Reis, Reisado ou Festa de Santos Reis (em Portugal diz-se Reisada ou Reiseiros), é uma manifestação católica, cultural e festiva, classificada sobretudo no Brasil como manifestação folclórica, comemorativa da festa religiosa da Epifania do Senhor ou Teofonia, que se caracteriza por celebrar a Adoração dos Magos ao nascimento de Jesus Cristo.

Referências bibliográficas

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